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sexta-feira, 3 de junho de 2011

Polícia do Amazonas ignorou notificações da ouvidoria agrária de que camponês seria morto

O ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, fez diversas notificações às autoridades policiais do Amazonas avisando que Adelino Ramos, o Dinho, assassinado na sexta-feira passada (27), poderia ser morto a qualquer momento por madeireiros que atuavam ilegalmente no Amazonas e em Rondônia.
As últimas notificações foram feitas em setembro de 2010 e em fevereiro deste ano. Em setembro, o ouvidor pediu proteção policial às famílias do assentamento onde Dinho morava, no extremo sul amazonense, que estavam recebendo constantes ameaças dos madeireiros, que circulavam armados pela região. Em fevereiro, Gercino pediu que fosse cumprido o mandado de prisão de Ozias Vicente, expedido pela Justiça de Lábrea (AM).
Vicente foi preso na última segunda-feira (30) em Porto Velho suspeito de ter matado Dinho em Vista Alegre do Abunã (RO), na divisa com o Amazonas. As notificações do ouvidor foram encaminhadas ao então secretário de Segurança Pública do Amazonas, Geraldo André Scarpellini Vieira, ao diretor-geral da Polícia Civil, Mauro César Medeiros Nunes, e ao comandante da Polícia Militar, coronel Dan Câmara.
Na notificação de setembro, Gercino pede que sejam tomadas “as medidas necessárias para garantir a segurança do acampamento dos trabalhadores rurais ligados ao Movimento Camponês Corumbiara (...) bem como a incolumidade física das famílias acampadas no local, haja vista que (...) Adelino Ramos endereçou correspondência a esta Ouvidoria Agrária Nacional nesta data, reportando que ele, assim como as famílias do acampamento, estão sendo ameaçadas pelos seguintes fazendeiros e  madeireiros: Luiz Vicente, Jobs Vicente, Ozias Vicente (...) e por outra pessoa conhecida como Ceará Popó" - que foi preso na terça-feira durante operação da Polícia Federal.

VEJA AS NOTIFICAÇÕES

  • Reprodução/Ouvidoria Agrária Nacional Trecho da notificação encaminhada pela ouvidoria agrária para as autoridades de segurança do Amazonas
  • Reprodução/Ouvidoria Agrária Nacional Mandado de prisão expedido no início deste ano contra Ozias Vicente, preso na segunda-feira (30) suspeito pela morte do líder camponês Adelino Ramos
Em outro trecho da notificação de setembro, o ouvidor relata às autoridades que os camponeses denunciaram ao Ministério Público e à delegacia de Lábrea a ocorrência de “grilagem de terras públicas, desmatamento, agressões físicas e ameaças de morte contra líderes e trabalhadores rurais sem-terra por fazendeiros e madeireiros da região do sul do município de Lábrea.”

Mandados de prisão não foram cumpridos

No início deste ano, a juíza da Comarca de Lábrea, Dinah Câmara Fernandes de Souza, expediu mandado de prisão preventiva contra Ozias Vicente e mais 14 madeireiros, após pedido da promotoria de Lábrea e da Polícia Civil do mesmo município. Na notificação encaminhada em fevereiro deste ano, o ouvidor reforçou a necessidade da agilidade no cumprimento dos mandados.
“Ressalto que a prisão preventiva em tela contribuirá, sem dúvida, para diminuir o número de conflitos agrários e principalmente a violência na zona rural da região sul do Estado do Amazonas.”
Os mandados de prisão preventiva, no entanto, não foram cumpridos. Em março, a defesa de Ozias conseguiu revogar o mandado. “Os mandados não foram cumpridos por falta de recursos humanos. Talvez se os mandados tivessem sido cumpridos o Dinho não teria sido morto”, afirmou o ouvidor agrário em entrevista ao UOL Notícias.
Gercino afirmou desconhecer o motivo pelo qual as notificações de proteção às famílias ameaçadas não foram atendidas, já que as autoridades não lhe responderam. O ouvidor cita dois momentos em que policiais civis e militares só permaneceram na área do conflito em Lábrea porque o custeio com as despesas da operação foi bancado com recursos da própria ouvidoria.
“Em 2008, pedimos à cúpula da Secretaria de Segurança Pública que mandassem reforço policial à área. Eles falaram que só poderiam ir para lá se a ouvidoria arcasse com as despesas. Nós conseguimos arcar com as despesas durante 90 dias, mas nossos recursos acabaram. Enquanto os policiais estiveram lá [em Lábrea], a situação ficou tranqüila.”
O outro momento em a ouvidoria bancou a permanência da polícia em Lábrea foi no ano passado. “Os policiais ficaram lá por 30 dias. Depois, assim que eles voltaram para Manaus, as ameaças voltaram a acontecer”, diz Gercino.
A reportagem procurou a Polícia Militar para saber o motivo pelo qual as notificações não foram atendidas, mas ainda não obteve uma resposta. A Secretaria de Segurança Pública foi procurada por meio de sua assessoria, mas afirmou que não podia atender a reportagem por conta de um evento que mobilizou todos funcionários do setor de comunicação.
O UOL Notícias procurou também a Justiça de Lábrea para saber por qual razão o mandado de prisão contra Ozias foi revogado, mas a Comarca informou que não tem autorização para repassar informações referentes a processos criminais.

Onda de mortes

Cinco camponeses foram mortos na região norte em menos de dez dias, quatro deles no sudeste paraense. O última morte foi de Marcos Gomes da Silva, 33, natural do Maranhão, assassinado em Eldorado dos Carajás no quarta-feira (1º).
Na semana passada, três mortes ocorreram em Nova Ipixuna, também no sudeste paraense: o casal de castanheiros José Cláudio Ribeiro da Silva, 52, e Maria do Espírito Santo da Silva, 50, ativistas que denunciavam a ação ilegal de madeireiros, foi executado na terça-feira (24); no domingo (29), foi encontrado o corpo de Eremilton Pereira dos Santos, 25, que morava no mesmo assentamento do casal.
Na sexta-feira (27), a vítima foi Adelino Ramos, o Dinho, liderança do Movimento Camponês Corumbiara (MCC), assassinado enquanto vendia verduras em Vista Alegre do Abunã, distrito de Porto Velho (RO). Dinho foi um dos sobreviventes do massacre de Corumbiara --ocorrido em agosto de 1995, no qual pelo menos 12 pessoas morreram nas mãos de pistoleiros e PMs-- e também denunciava a atuação de madeireiros.
Ninguém foi preso pelos crimes ocorridos no Pará. Em Rondônia, o suspeito Ozias Vicente, que atuava na extração ilegal de madeira, foi detido na segunda-feira (30). A polícia investiga a participação de outras pessoas no crime.

Veja onde os camponeses foram mortos

Após execução de líder camponês, agricultores de assentamento fogem de ameaças no Amazonas

Assentamento Florestal Curuquetê, em Lábrea (AM), onde vivia o camponês Adelino Ramos, em fotografia tirada nesta sexta-feira (03) (Divulgação/Ibama)
As famílias do Projeto de Assentamento Florestal (PAF) Curuquetê, cuja principal liderança era o camponês Adelino Ramos, conhecido como Dinho, assassinado no último dia 27, se dispersaram, com receio de serem perseguidas e ameaçadas.
Durante visita realizada nesta sexta-feira (03) no assentamento (a primeira desde o assassinato), localizado na região do município de Lábrea, no sul do Amazonas, agentes da Polícia Federal e do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) identificaram no local apenas cinco famílias, segundo o advogado dos agricultores, Rafael Claros.
Segundo Claros, em entrevista ao portal acritica.com, as cinco famílias estão se sentindo desamparadas e com dificuldade de acesso a outras áreas. Conforme o advogado, no local viviam 20 famílias.
O carro de Ramos, único meio de locomoção das famílias do assentamento, permanece retido na Delegacia de Extrema, distrito de Porto Velho (RO).
“O pessoal está isolado e sem alimento. Eles estão se sentindo abandonados. Está faltando um líder depois que o Adelino foi assassinado”, disse Claros.
A ida da PF e do Ibama ao assentamento faz parte das investigações para esclarecer o assassinato de Adelino Ramos.
Foram recolhidas informações do computador do agricultor e do telefone celular, além de documentos que provam denúncias anteriores e pedidos de socorro feitos pelos camponeses em função das ameaças que vinham sofrendo.
Reparação
A viúva de Adelino, cujo nome não vem sendo identificado, permanece longe do assentamento, para ser “preservada”, pois continua sendo ameaçada, especialmente após ter testemunhado a morte do marido, segundo Claros.
Conforme o advogado, a família de Adelino Ramos estuda buscar reparação contra a União pela inexistência do poder público na área e pelo fato de nenhum órgão ter dado ouvido às denúncias realizadas pelos camponeses.
Responsabilidade
Indagado sobre a criação do PAF pelo Instituto Nacional de Colonização Agrária (Incra), publicada nesta sexta-feira (03) no Diário Oficial da União, Rafael Claros disse que esta é uma medida que chegou atrasada, porque sua demora levou muita insegurança jurídica aos assentados.
Claros destacou a morosidade do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) em liberar o licenciamento ambiental que daria ao Incra o respaldo para reconhecer o PAF.
“Eu estive pessoalmente no Incra, em Manaus, umas dez vezes desde 2008. Também ligava dia sim, dia não ao Ipaam e não nos davam qualquer resposta. Uma semana antes do Dinho morrer, me disseram no Ipaam que o licenciamento só sairia em 60 dias. E era licenciamento prévio, mais simples. Não era uma licença mais elaborada, que precisava de visita técnica”, disse o advogado.
O advogado disse que foi a “insegurança jurídica” e a falta de determinação federal que facilitou a ação de desmatadores na região, inclusive nas glebas e nos assentamentos.
Ele salientou que “apenas” a Secretaria de Produção Rural do Amazonas (Sepror) apoiou os agricultores.
A reportagem não conseguiu falar com a superintendente do Incra, Maria do Socorro Feitoza.
Ipaam
Procurada, o Ipaam enviou a seguinte nota, publicada na íntegra:
“ O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaaesclarece que a velocidade com que é emitida uma licença não é matemática. Ela é diretamente proporcional à velocidade e correção com que são entregues os documentos pelos solicitantes.
O Projeto de Assentamento Florestal Curuquetê não é a única demanda do Incra e do Ipaam.
Em razão disso, os dois órgãos, há um pouco mais de um mês, realizaram uma reunião na qual o Incra assumiu o compromisso de acelerar a entrega da documentação dos projetos de assentamento e o Ipaam, por sua vez, assumiu o compromisso de acelerar a análise e a conseqüente emissão das licenças.
Da reunião resultou maior velocidade na tramitação dos processos do Incra o que resultou na conclusão do processo do PAF Curuquetê, com a licença emitida no dia 26 de maio, infelizmente na véspera do episódio que culminou na morte do líder do assentamento, Adelino Ramos”.
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